Em agosto de 2022, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) deu início em mais um de seus projetos pautados no programa Justiça 4.0, com a criação do Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos, que tem sido reconhecido pela junção parcial de suas iniciais “Sniper”.
O Sniper tem como finalidade unificar todos os sistemas de buscas de bens atualmente existentes.
O dispositivo é interligado ao Cadastro Nacional de Pessoas físicas e jurídicas, podendo a busca de ativos ser realizada tanto pelo nome quanto pela documentação das partes. Será possível consultar as bases de candidatos e bens declarados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), informações sobre sanções administrativas, empresas punidas e acordos de leniência (CGU), dados do Registro Aeronáutico Brasileiro (ANAC), embarcações listadas no Registro Especial Brasileiro (Tribunal Marítimo), informações fiscais (INFOJUD) e bancárias (SISBAJUD),
além de dados sobre processos judiciais, como partes, classe, assunto dos processos e valores.
O Sniper foi criado em decorrência da morosidade do Poder Judiciário. O Brasil é um dos países que detém o maior número de processos judiciais no mundo e segundo informações do próprio CNJ, mesmo que a justiça brasileira paralisasse sem ingresso de novas demandas, com a atual produtividade, seriam necessários aproximadamente três anos de trabalho para zerar o estoque contencioso.
Neste passo, a introdução do sistema “Sniper” no mundo jurídico vai ao encontro do princípio da celeridade processual e da razoável duração do processo, visando agilizar as medidas para obter em um prazo plausível a satisfação da demanda.
É notório que o sistema processual nacional vem se modernizando, para tornar os processos judiciais menos burocráticos e mais eficazes. Assim surge o Sniper, que, com sua implementação e consolidação total, os processos de recuperação de crédito se tornarão mais céleres e efetivos, uma vez que a partir de um único meio será possível ter um retrato concreto da situação patrimonial da parte executora. A grande problemática da recuperação de ativos decorre da forma maliciosa como agem alguns devedores, eis que tentam de todas as formas não pagar suas dívidas, mediante a ocultação de patrimônio, transferindo
o para parentes ou até mesmo para alguns “laranjas”. Em verdade, a ocultação de bens fere o princípio da cooperação processual, visto que se torna um meio de procrastinar à execução, de modo a torná-la infrutífera.
Em fase de implementação, alguns tribunais, como o Tribunal de Justiça de São Paulo, ainda não utilizam o Sniper por falta de regulamentação, como denota-se da ementa do acórdão abaixo:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO. Decisão indeferindo utilização da ferramenta “sniper”. Sistema que integra os mecanismos de busca e ativos existentes. Pesquisa de ativos já realizadas na execução. Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos (SNIPER) ainda não regulamentado pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Decisão mantida. RECURSO IMPROVIDO.” (TJ-SP-AI: 2251582-
55.2022.8.26.0000, Rel.: Maria Salete Corrêa Dias, Julgamento: 31/10/2022, 2ª Câm. de Dir. Privado, Publicação: 31/10/2022) (g.n).
Fato é que, após a regularização, a inadimplência e a morosidade dos nossos tribunais tendem a cair de forma drástica, vez que o referido mecanismo é capaz de identificar se o devedor é sócio de alguma empresa, estando apto a detectar a confusão patrimonial entre sócios
e firmas, participações em sociedades, cruzamento de dados entre as entidades empresariais, etc.
Do ponto de vista empresarial, será possível, de forma mais célere, investigar sobre a existência de grupo econômico entre as empresas, para eventual pedido de desconsideração da personalidade jurídica. Todavia, mais importante do que o que o invento nos fornece, é o que seremos capazes de fazer com as informações recebidas, visto que será mais amplo o leque de possibilidades para perseguir o débito judicial.
Por fim, o “Sniper” surge para concretizar e dar maior eficiência aos mecanismos atuais, vez que a tecnologia introduzida pelo CNJ vem se tornando uma aliada nesse processo de redução da inadimplência e a ferramenta deve ser utilizada como um instrumento de enorme valia, em razão da sua ampla forma de busca.
Embora o Sniper seja uma esperança para os autores e se alie as demais formas de pesquisas disponíveis a serviço dos tribunais, a medida só nos remete a uma vertente: É imperioso a intervenção do Judiciário para a recuperação de ativos, vez que, sem o deferimento das medidas pelo magistrado, o autor nada poderá fazer.
Sob o ponto de vista crítico, mais importante que a modernização, é o incentivo do CNJ pelos métodos alternativos de resolução de conflitos, visando a solução amigável das demandas, promovendo e estimulando a realização de acordos para descongestionar o Judiciário, evitando assim, transtornos para as partes envolvidas. Este é o caminho mais curto para o deslinde dos processos em curso, pois não são raros os casos em que os inadimplentes realmente não possuem bens, frustrando o credor e a Justiça.
*Vinycius Dunzinger é advogado de contencioso Cível e Empresarial no Donelli, Abreu Sodré e Nicolai Advogados – DAS
*Renato Leopoldo e Silva é Head de Contencioso Empresarial Cível, Recuperação de Empresas e Arbitragem no Donelli, Abreu Sodré e Nicolai Advogados – DSA
https://www.estadao.com.br/politica/blog-do-fausto-macedo/sniper-e-a-reducao da-inadimplencia/
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