A empresa tem um papel no combate às práticas racistas e discriminatórias, centralizando as suas ações na formação e educação dos colaboradores, principalmente na formação de uma liderança capaz de orientar e resolver conflitos que possam surgir. Quem afirma é a advogada Fernanda Perregil, especialista em direito do trabalho e direito antidiscriminatório.

Consultora de diversidade e inclusão, ela afirma ser fundamental conhecer todas as formas de discriminação e como isso impacta e se prolifera nas construções sociais, inclusive no ambiente de trabalho. “O primeiro passo é entender os aspectos sociais do tema, depois os impactos jurídicos e a responsabilidade legal da empresa em combater tais práticas no ambiente de trabalho”, afirma.

Em cinco perguntas e respostas, Fernanda, que é sócia do DSA Advogados, esclarece a responsabilidade das companhias no combate ao racismo e outras formas de discriminação, e como prevenir e sancionar essas condutas no ambiente de trabalho. Leia abaixo:

Qual a responsabilidade das empresas em combater atos de racismo no ambiente de trabalho?

Pela lei, a empresa é responsável por proteger e resguardar as pessoas colaboradoras no ambiente de trabalho, seja este físico ou virtual, isso inclui a necessidade de prevenção e combate a qualquer ato racista ou prática discriminatória no ambiente de trabalho. Por isso, a necessidade de implementar medidas internas e ações institucionais na empresa.

Frases ou comportamentos racistas no ambiente de trabalho podem gerar demissão por justa causa?

Podem sim. Primeiro é importante que a empresa tenha um canal de denúncia para que as pessoas possam denunciar e para que exista uma apuração interna. As práticas racistas podem levar a punições ao empregado que pratica um ato de racismo contra um colega de trabalho. Pela legislação trabalhista existem algumas formas de punição – advertência, suspensão e justa causa.

Há uma exigência de gradação da pena, já que o rompimento do contrato por justa causa é a penalidade mais grave aplicada ao trabalhador, o que significa dizer também que a punição deve ser proporcional ao ato e deve guardar um caráter pedagógico. Por isso, é importante que a empresa tenha um Protocolo Interno sobre como agir em situações como essa, pois nem sempre a aplicação extrema da justa causa resolve a questão ou alcança os objetivos principais que é formar e educar as pessoas colaboradoras.

A empresa precisava saber conduzir esse tipo de situação, entendendo que essas discriminações são estruturais, em que a educação é a melhor saída para prevenção e evitar que essas situações voltem a acontecer.

Publicações racistas de funcionários nas redes também podem gerar punições por parte da empresa?

Esse tema é bem controverso, pois existe um entendimento de que a rede social não estaria vinculada ao ambiente de trabalho, mas a vida privada da pessoa. Contudo, o que se tem visto no mundo pós-pandemia é que a vida profissional e a vida pessoal ficaram muito integradas e completamente misturadas.

Além disso, a nossa evolução social vem apontando para total intolerância às práticas discriminatórias ou racistas nas redes sociais ou fora dela, sendo que as empresas estão sendo cobradas por tomar alguma postura com seus colaboradores, mesmo fora do horário de trabalho, inclusive cobrando-as sobre o desligamento destas pessoas de seus quadros funcionais.

Então, a punição de empregados por parte da empresa por práticas racistas na rede social vem sendo cada vez mais aceita e admissível.

O que acontece com a empresa se o ato de racismo vem de um gerente ou de outro superior hierárquico?

O entendimento sobre o combate às práticas racistas não exclui nenhum cargo na empresa, podendo haver alguma relação hierárquica entre essas pessoas ou até mesmo, pares na mesma equipe.

O que ocorre é que quando essa prática vem da própria liderança o impacto é muito maior, porque as pessoas líderes tem um papel essencial na formação da cultura organizacional e na forma de condução das relações dentro da empresa.

Os riscos são ainda maiores para a empresa por uma prática racista propagada pela própria liderança, não só por aumentar a possibilidade de sofrer uma ação trabalhista indenizatória, mas também pelo risco reputacional vinculado à empresa.

 

O que exatamente deve ser previsto nos programas de compliance das empresas para combate ao racismo?

O compliance além de visar a construção de normas internas, deve também assegurar que as práticas internas estejam em conformidade com essas normas, além da legislação.

Pela sensibilidade e relevância do tema de combate ao racismo, o compliance deve fazer um trabalho específico dentro desse assunto, elaborando códigos de conduta e ética, indicando os valores da empresa e que práticas racistas não serão toleradas no ambiente de trabalho, incluindo a formação de indicadores de performance para aumento da diversidade no quadro de pessoas, manuais de boas práticas, cartilhas de diversidade, orientando as pessoas em como resolver situações ou conflitos sobre o assunto.

 

Artigo original: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2023/05/27/racismo-no-ambiente-de-trabalho-entenda-o-que-as-empresas-devem-fazer.ghtml

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