Os primeiros cinco meses do ano foram marcados por uma sucessão de pedidos de recuperação judicial de grandes empresas em setores diversos como varejo, telecomunicações, bebidas e energia, entre outros. Somadas, Americanas, Oi, Cervejaria Petrópolis e Light requisitaram à Justiça proteção contra a cobrança de dívidas que totalizam mais de R$ 100 bilhões – as três primeiras já tiveram seu pleito atendido. Especialistas jurídicos concordam a respeito do impacto de fatores como as taxas de juros e os ciclos econômicos sobre o número de pedidos de recuperação judicial. Mas destacam também que os desdobramentos de casos emblemáticos – como os da Americanas e da Light – podem interferir no ritmo e no formato de novos pedidos.

Sócio-fundador e diretor da área de recuperação de crédito bancário estratégico do escritório Medina Guimarães Advogados, Rafael Guimarães enxerga uma aceleração neste ano dos pedidos de recuperação judicial feitos por grandes empresas. “No nosso escritório, […] a frequência dessas recuperações judiciais está quase o dobro do que estava no ano passado, no período de fevereiro a maio”, exemplifica o advogado.

De maneira geral, o número de pedidos de recuperação judicial no país cresceu 43,1% em abril, na comparação com o mesmo mês de 2022, de acordo com levantamento do Serasa Experian. O total passou, no período, de 65 para 93. O número de falências também aumentou no mês passado 12,3%, na comparação anual.

Os dados compilados pela Serasa Experian nos três últimos meses parecem comprovar a percepção de Guimarães. Nos relatórios de abril, março e fevereiro deste ano foram contabilizados 31 pedidos de recuperação judicial de grandes empresas ao todo, contra 23 em igual período de 2022.

Na avaliação do sócio do Medina Guimarães Advogados, a preservação da empresa em dificuldades financeiras se tornou prioridade em detrimento do pagamento dos credores a partir da entrada em vigor da Lei de Recuperação de Empresas e Falência (nº 11.101), em 2005. “A preservação da empresa se tornou mandamento principal da lei”, diz o advogado. “O que vier no caso da Americanas vai ser muito importante para o rumo das recuperações judiciais no país”, acrescenta.

A preservação da atividade empresarial da Light foi um dos argumentos utilizados pelos advogados da companhia para requerer à Justiça a proteção contra cobranças não só da holding mas também de suas concessionárias. A Light informou ao mercado na sexta-feira (12) que deu entrada em um pedido de recuperação judicial que engloba cerca de R$ 11 bilhões em dívidas.

Como a Lei nº 12.767/12 estabelece que concessionárias de serviços públicos de energia elétrica não podem requerer recuperação judicial e extrajudicial, o pedido da empresa fluminense foi interposto pela holding Light e não pela distribuidora Light Serviços de Eletricidade.

“A concessão não estará submetida ao regime [da Lei] 11.101. O stay period [prazo durante o qual ficam suspensas ações e execuções contra a empresa] virá apenas para proteger todo o sistema, garantindo que – equacionando a dívida [financeira] – a Light esteja absolutamente saneada”, esclarece Luiz Roberto Ayoub, sócio do Galdino & Coelho, Pimenta, Takemi, Ayoub Advogados, um dos escritórios contratados pela empresa.

Para o diretor da área de contencioso empresarial cível, recuperação de empresas e arbitragem do escritório DSA Advogados, Renato Leopoldo e Silva, preservar a qualquer custo a continuidade das operações de uma empresa em recuperação judicial pode gerar um fardo para a sociedade. Manter a empresa “respirando por aparelhos” pode encarecer o crédito para ela própria e para outras companhias do setor, exemplifica Silva. Além disso, a cadeia de fornecedores da empresa em dificuldade tende a minguar e até quebrar se as dívidas incluídas na recuperação judicial não forem quitadas de forma satisfatória.

“A Light defende que suas subsidiárias devem estar protegidas pelo stay period, mas não estão em recuperação judicial. Vamos ver o que a Justiça vai decidir a respeito”, diz Silva, sem arriscar um prognóstico a respeito do caso da distribuidora de energia.

Comparada com as recuperações judiciais da Americanas e da Oi, já deferidas pela Justiça, a Light abrange um montante menor de dívidas. A varejista, na versão revisada da sua lista de credores, publicada em fevereiro, soma R$ 42,5 bilhões.

A Oi, por sua, vez teve um segundo pedido de recuperação judicial aceito pela Justiça em março. A versão mais recente da lista de credores divulgada pela operadora de telecomunicações compreende R$ 44,3 bilhões em débitos.

Artigo Original: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2023/05/15/grandes-recuperacoes-ultrapassam-r-100-bi-em-2023.ghtml

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